Entrevista com especialista em
bioética, Pe. Helio Luciano
Por Thácio Siqueira
BRASILIA, segunda-feira, 6 de Agosto de 2012 (ZENIT.org)
- Na quarta-feira, 27 de Julho, o Anteprojeto do novo Código Penal Brasileiro
foi entregue nas mãos do presidente do Senado, José Sarney, pelos 15 juristas
que o elaboraram.
Para ajudar os católicos e pessoas de boa vontade
do Brasil na reflexão sobre as implicações desse anteprojeto, ZENIT entrevistou
o especialista em bioética, Pe. Hélio (para ler anterior entrevista com Pe.
Hélio, sobre o aborto no Brasil clique aqui), membro da comissão de bioética da
CNBB.
Publicamos hoje a primeira parte. Amanhã e depois
de amanhã publicaremos a segunda e a terceira parte consecutivamente.
***
ZENIT: Qual é a sua opinião sobre o Anteprojeto do
Código Penal entregue ao Senado Federal recentemente? Houve participação de
católicos preparados em todo o período de estudo e de debate sobre o
anteprojeto? O governo se interessou realmente em fazer que a sociedade
debatesse todos os pontos? Houve uma aceitação das propostas enviadas pela
liderança da Igreja católica, dos cristãos no geral, e de todos os que são
contrários ao aborto, como os espíritas e outros grupos?
Pe. Hélio Luciano |
PE.HELIO - Há que se falar, antes de qualquer coisa, da
necessidade premente de um novo Código Penal no Brasil. O atual está defasado,
tanto pela sua “idade” – já passa dos setenta anos – como pelo fato de que,
desde a sua promulgação durante o “Estado Novo”, foram promulgadas ou
outorgadas pelo menos outras três Constituições no Brasil (alguns consideram
que foram quatro). Neste período, o Código atual foi sofrendo diversas emendas,
perdendo sua unidade e, em alguns pontos, mantendo regulamentações que já não
condizem às práticas atuais. Também é necessário dizer que o texto do
Anteprojeto para o novo Código Penal, apresentado pela comissão de juristas, é
um texto claro, unitário e, em grande parte, em conformidade com a Constituição
Cidadã de 1988.
Ainda que no seu conjunto seja um texto positivo,
existem alguns pontos que contradizem tanto a nossa Carta Magna como a opinião
da imensa maioria dos brasileiros. Sendo assim, minha preocupação em relação a
este Anteprojeto é, em primeiro lugar, uma preocupação em sentido jurídico – um
Código Penal não pode legislar afrontando a Constituição, criando ou eximindo
de crime aquilo que a Carta Magna defende. Em segundo lugar, preocupa-me que
alguns valores próprios de uma sociedade tentem ser desrespeitados de modo
quase despótico, ou seja, sem ampla consulta à sociedade. É verdade que havia
um canal de sugestões no Senado no qual foram apresentadas aproximadamente
3.000 propostas, mas pergunto-me: quantas pessoas sabiam que o código penal
estava sendo reelaborado e que são 3.000 sugestões para uma população de quase
200.000.000 de habitantes?
O que reivindico – até este ponto – não tem nenhuma
conotação religiosa – peço apenas o respeito à Constituição e aos valores
próprios de um povo.
Em terceiro lugar – mas não menos importante –
preocupa-me que em um País de imensa maioria cristã, alguns valores defendidos
pelo cristianismo possam ser simplesmente contrariados. Não se trata aqui de
reivindicar a presença de católicos ou de outros cristãos na comissão de
juristas, mas sim de defender que os valores cristãos – próprios da nossa
sociedade – fossem respeitados. Certamente a laicidade do Estado não pode ser
confundida com um laicismo. A laicidade separa o Estado da religião enquanto o
laicismo nega todos os valores de uma sociedade.
Finalmente, é bom lembrar que as falhas do
Anteprojeto não se referem apenas às questões ligadas à vida – como o aborto e
a eutanásia – mas também a outras questões importantes como, por exemplo, o uso
de drogas e a aceitação de um terrorismo bom.
ZENIT: Ainda há algo a ser feito ou podemos dizer
que a proposta atual é a proposta que vai permanecer?
PE.HELIO - Certamente há ainda muito a ser feito. O
Anteprojeto do Código Penal, como diz o próprio nome, não é ainda nem mesmo o
projeto que será submetido a votação. Agora é o momento de juristas competentes
enviarem emendas ao texto. Este é o momento também da sociedade exercer sua função
dentro da democracia – explicando aos amigos o que está em jogo, usando a
mídia, as redes sociais, os e-mails, entre outros meios, para que não
aceitemos, passivamente, que mudem a nossa sociedade naquilo que não estamos de
acordo. Um modo de nos fazer ouvir também seria enviar e-mails aos Senadores e
Deputados, manifestando a nossa opinião através de argumentos racionais – se um
ou dois enviam, não surtirá efeito, mas se uma grande porcentagem da população
começa a escrever, com certeza nos ouvirão.
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